A imagem de uma cruz é
uma imagem forte, eloquente. A maioria das pessoas concordaria com a afirmação
segundo a qual não é fácil ficar impassível diante da imagem de um crucifixo.
Entretanto, a maioria de nós, talvez por sermos já demasiadamente acostumados
com sua presença, nem chega a percebê-lo realmente, semelhante ao que acontece
quando – de tão acostumados com sua presença – já nem percebemos o sofrimento
dos mais necessitados que, às vezes, moram ali, ao nosso lado.
Esta nossa “cegueira”
certamente espantaria os primeiros cristãos, nossos irmãos, para quem o
crucifixo era um sinal tão forte que foi evitado por muito tempo. Basta uma
rápida olhada na iconografia cristã dos primeiros séculos para perceber que o
crucifixo foi introduzido bastante tardiamente como símbolo cristão. No final
das contas, era um instrumento de tortura e morte. Também nós hesitaríamos em empregar
uma forca ou a cadeira elétrica como símbolos religiosos.
É natural, portanto,
que alguns, diversamente do que ocorre com a maioria das pessoas, consigam sim
enxergar o crucifixo em toda a sua significação e, indo ainda mais longe, sejam
capazes de ver o que a maioria nem sequer imaginaria. Catherine, por exemplo,
olhando o crucifixo, via também o outro lado, aquele vazio. Em sua
sensibilidade, sentia como se o lado vazio da cruz a chamasse, a esperasse. O
raciocínio é simples: se o cristão é um outro Cristo, deve ser crucificado; a
cruz possui dois lados, o primeiro está ocupado pelo Senhor, o outro, é meu!
Mas a cruz implica
também outros ferimentos, em especial, ter o coração traspassado pela lança do
amor de Deus. Catherine enxerga nesta chaga a nossa capacidade de levar o mundo
inteiro a Deus, fazendo-o passar, antes, pela chaga do nosso coração. É como se
o caminho que leva o Outro a Deus passasse, necessariamente, pelo meu coração.
Nosso coração parece ser, naturalmente, fechado; felizmente existe uma forma de
abri-lo ao próximo: a cruz e a lança!
“O único caminho possível, pelo qual
a esperança pode ser reconduzida ao
mundo, consiste em afiar a lança e
cravá-la no próprio coração,
pela renúncia e pelo sacrifício, à
maneira como o coração de Cristo
foi alanceado. Assim haverá em cada
coração uma porta aberta para o amor
e para a esperança (...) Assim é que
o nosso coração pode levar outros
ao coração de Cristo, de onde
ressurgirão para a alegria e a esperança.”
Catherine de Hueck
Doherty
(Em “Sobornost: União na
Fraternidade”- Título original: Sobornost:
Eastern Unity of Mind and Heart for Western Man)